quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

"Eu Tenho Um Sonho" ( I Have A Dream )

Ontem acompanhando o noticiário televisivo, escrito e on-line uma noticia me chamou a atenção; um prefeito que me recuso a citar o nome, diz para uma moradora que o alerta estar morando em área de risco por não ter condições de morar em um lugar melhor, a seguinte frase: "morra, morra minha filha".
Fiquei indignado com a falta de educação de um homem publico, e refletindo sobre isso notei que o Brasil sofre de um tipo de preconceito terrível; o preconceito de classes. Não adianta achar que o preconceito aqui seja por cor, crença, ou qualquer outra coisa, aqui o caso e estritamente financeiro. Se você não tem dinheiro você e um paria.
Para comprovar isso basta ver como as pessoa que vivem nas periferias brasileiras vivem esquecidas na área da educação, da moradia, dos transportes e da saúde. Quem e pobre aqui esta praticamente sentenciado a morrer pobre.
O discurso feito por Martin Luther King Jr. No dia 28 de Agosto de 1963 nos degraus do Lincoln Memorial como parte da Marcha de Washington por Emprego e Liberdade e muito atual e escancara nossa realidade, basta traze-lo para a realidade brasileira, nossa triste realidade.

“Eu estou contente em unir-me com vocês no dia que entrará para a história como a maior demonstração pela liberdade na história de nossa nação.

Cem anos atrás, um grande americano, na qual estamos sob sua simbólica sombra, assinou a Proclamação de Emancipação. Esse importante decreto veio como um grande farol de esperança para milhões de escravos negros que tinham murchados nas chamas da injustiça. Ele veio como uma alvorada para terminar a longa noite de seus cativeiros.

Mas cem anos depois, o Negro ainda não é livre.

Cem anos depois, a vida do Negro ainda é tristemente inválida pelas algemas da segregação e as cadeias de discriminação.

Cem anos depois, o Negro vive em uma ilha só de pobreza no meio de um vasto oceano de prosperidade material. Cem anos depois, o Negro ainda adoece nos cantos da sociedade americana e se encontram exilados em sua própria terra. Assim, nós viemos aqui hoje para dramatizar sua vergonhosa condição.

De certo modo, nós viemos à capital de nossa nação para trocar um cheque. Quando os arquitetos de nossa república escreveram as magníficas palavras da Constituição e a Declaração da Independência, eles estavam assinando uma nota promissória para a qual todo americano seria seu herdeiro. Esta nota era uma promessa que todos os homens, sim, os homens negros, como também os homens brancos, teriam garantidos os direitos inalienáveis de vida, liberdade e a busca da felicidade. Hoje é óbvio que aquela América não apresentou esta nota promissória. Em vez de honrar esta obrigação sagrada, a América deu para o povo negro um cheque sem fundo, um cheque que voltou marcado com “fundos insuficientes”.

Mas nós nos recusamos a acreditar que o banco da justiça é falível. Nós nos recusamos a acreditar que há capitais insuficientes de oportunidade nesta nação. Assim nós viemos trocar este cheque, um cheque que nos dará o direito de reclamar as riquezas de liberdade e a segurança da justiça.

Nós também viemos para recordar à América dessa cruel urgência. Este não é o momento para descansar no luxo refrescante ou tomar o remédio tranqüilizante do gradualismo.

Agora é o tempo para transformar em realidade as promessas de democracia.

Agora é o tempo para subir do vale das trevas da segregação ao caminho iluminado pelo sol da justiça racial.

Agora é o tempo para erguer nossa nação das areias movediças da injustiça racial para a pedra sólida da fraternidade. Agora é o tempo para fazer da justiça uma realidade para todos os filhos de Deus.

Seria fatal para a nação negligenciar a urgência desse momento. Este verão sufocante do legítimo descontentamento dos Negros não passará até termos um renovador outono de liberdade e igualdade. Este ano de 1963 não é um fim, mas um começo. Esses que esperam que o Negro agora estará contente, terão um violento despertar se a nação votar aos negócios de sempre.

Mas há algo que eu tenho que dizer ao meu povo que se dirige ao portal que conduz ao palácio da justiça. No processo de conquistar nosso legítimo direito, nós não devemos ser culpados de ações de injustiças. Não vamos satisfazer nossa sede de liberdade bebendo da xícara da amargura e do ódio. Nós sempre temos que conduzir nossa luta num alto nível de dignidade e disciplina. Nós não devemos permitir que nosso criativo protesto se degenere em violência física. Novamente e novamente nós temos que subir às majestosas alturas da reunião da força física com a força de alma. Nossa nova e maravilhosa combatividade mostrou à comunidade negra que não devemos ter uma desconfiança para com todas as pessoas brancas, para muitos de nossos irmãos brancos, como comprovamos pela presença deles aqui hoje, vieram entender que o destino deles é amarrado ao nosso destino. Eles vieram perceber que a liberdade deles é ligada indissoluvelmente a nossa liberdade. Nós não podemos caminhar só.

E como nós caminhamos, nós temos que fazer a promessa que nós sempre marcharemos à frente. Nós não podemos retroceder. Há esses que estão perguntando para os devotos dos direitos civis, “Quando vocês estarão satisfeitos?”

Nós nunca estaremos satisfeitos enquanto o Negro for vítima dos horrores indizíveis da brutalidade policial. Nós nunca estaremos satisfeitos enquanto nossos corpos, pesados com a fadiga da viagem, não poderem ter hospedagem nos motéis das estradas e os hotéis das cidades. Nós não estaremos satisfeitos enquanto um Negro não puder votar no Mississipi e um Negro em Nova Iorque acreditar que ele não tem motivo para votar. Não, não, nós não estamos satisfeitos e nós não estaremos satisfeitos até que a justiça e a retidão rolem abaixo como águas de uma poderosa correnteza.

Eu não esqueci que alguns de você vieram até aqui após grandes testes e sofrimentos. Alguns de você vieram recentemente de celas estreitas das prisões. Alguns de vocês vieram de áreas onde sua busca pela liberdade lhe deixaram marcas pelas tempestades das perseguições e pelos ventos de brutalidade policial. Você são o veteranos do sofrimento. Continuem trabalhando com a fé que sofrimento imerecido é redentor. Voltem para o Mississippi, voltem para o Alabama, voltem para a Carolina do Sul, voltem para a Geórgia, voltem para Louisiana, voltem para as ruas sujas e guetos de nossas cidades do norte, sabendo que de alguma maneira esta situação pode e será mudada. Não se deixe caiar no vale de desespero.

Eu digo a você hoje, meus amigos, que embora nós enfrentemos as dificuldades de hoje e amanhã. Eu ainda tenho um sonho. É um sonho profundamente enraizado no sonho americano.

Eu tenho um sonho que um dia esta nação se levantará e viverá o verdadeiro significado de sua crença – nós celebraremos estas verdades e elas serão claras para todos, que os homens são criados iguais.

Eu tenho um sonho que um dia nas colinas vermelhas da Geórgia os filhos dos descendentes de escravos e os filhos dos desdentes dos donos de escravos poderão se sentar junto à mesa da fraternidade.

Eu tenho um sonho que um dia, até mesmo no estado de Mississippi, um estado que transpira com o calor da injustiça, que transpira com o calor de opressão, será transformado em um oásis de liberdade e justiça.

Eu tenho um sonho que minhas quatro pequenas crianças vão um dia viver em uma nação onde elas não serão julgadas pela cor da pele, mas pelo conteúdo de seu caráter. Eu tenho um sonho hoje!

Eu tenho um sonho que um dia, no Alabama, com seus racistas malignos, com seu governador que tem os lábios gotejando palavras de intervenção e negação; nesse justo dia no Alabama meninos negros e meninas negras poderão unir as mãos com meninos brancos e meninas brancas como irmãs e irmãos. Eu tenho um sonho hoje!

Eu tenho um sonho que um dia todo vale será exaltado, e todas as colinas e montanhas virão abaixo, os lugares ásperos serão aplainados e os lugares tortuosos serão endireitados e a glória do Senhor será revelada e toda a carne estará junta.

Esta é nossa esperança. Esta é a fé com que regressarei para o Sul. Com esta fé nós poderemos cortar da montanha do desespero uma pedra de esperança. Com esta fé nós poderemos transformar as discórdias estridentes de nossa nação em uma bela sinfonia de fraternidade. Com esta fé nós poderemos trabalhar juntos, rezar juntos, lutar juntos, para ir encarcerar juntos, defender liberdade juntos, e quem sabe nós seremos um dia livre. Este será o dia, este será o dia quando todas as crianças de Deus poderão cantar com um novo significado.

“Meu país, doce terra de liberdade, eu te canto.

Terra onde meus pais morreram, terra do orgulho dos peregrinos,

De qualquer lado da montanha, ouço o sino da liberdade!”

E se a América é uma grande nação, isto tem que se tornar verdadeiro.

E assim ouvirei o sino da liberdade no extraordinário topo da montanha de New Hampshire.

Ouvirei o sino da liberdade nas poderosas montanhas poderosas de Nova York.

Ouvirei o sino da liberdade nos engrandecidos Alleghenies da Pennsylvania.

Ouvirei o sino da liberdade nas montanhas cobertas de neve Rockies do Colorado.

Ouvirei o sino da liberdade nas ladeiras curvas da Califórnia.

Mas não é só isso. Ouvirei o sino da liberdade na Montanha de Pedra da Geórgia.

Ouvirei o sino da liberdade na Montanha de Vigilância do Tennessee.

Ouvirei o sino da liberdade em todas as colinas do Mississipi.

Em todas as montanhas, ouviu o sino da liberdade.

E quando isto acontecer, quando nós permitimos o sino da liberdade soar, quando nós deixarmos ele soar em toda moradia e todo vilarejo, em todo estado e em toda cidade, nós poderemos acelerar aquele dia quando todas as crianças de Deus, homens pretos e homens brancos, judeus e gentios, protestantes e católicos, poderão unir mãos e cantar nas palavras do velho spiritual negro:

“Livre afinal, livre afinal.



Agradeço ao Deus todo-poderoso, nós somos livres afinal.”



terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Carta de Uma Professora.


Carta escrita por uma professora que trabalha  no Colégio Estadual Mesquita, à revista Veja. 

RESPOSTA À REVISTA VEJA
 
Sou professora do Estado e fiquei indignada com a reportagem da jornalista Roberta de Abreu Lima “Aula Cronometrada”. É com grande pesar que vejo quão distante estão seus argumentos sobre as causas do mau desempenho escolar com as VERDADEIRAS  razões que  geram este panorama desalentador. 
Não há necessidade de cronômetros, nem de especialistas  para diagnosticar as falhas da educação. Há necessidade de todos os que pensam que: “os professores é que são incapazes de atrair a atenção de alunos repletos de estímulos e inseridos na era digital” entrem numa sala de aula e observem a realidade brasileira. Que alunos são esses “repletos de estímulos” que muitas vezes não têm o que comer em suas casas quanto mais inseridos na era digital? Em que  pais de famílias oriundas da pobreza  trabalham tanto que não têm como acompanhar os filhos  em suas atividades escolares, e pior em orientá-los para a vida? Isso sem falar nas famílias impregnadas pelas drogas e destruídas pela ignorância e violência, causas essas que infelizmente são trazidas para dentro da maioria das escolas brasileiras. Está na hora dos professores se rebelarem contra as acusações que lhes são impostas. Problemas da sociedade deverão ser resolvidos pela sociedade e não somente pela escola.
Não gosto de comparar épocas, mas quando penso na minha infância, onde pai e mãe, tios e avós estavam presentes e onde era inadmissível faltar com o respeito aos mais velhos, quanto mais aos professores e não cumprir as obrigações fossem escolares ou simplesmente caseiras, faço comparações com os alunos de hoje “repletos de estímulos”. Estímulos de quê?  De passar o dia na rua, não fazer as tarefas, ficar em frente ao computador, alguns até altas horas da noite, (quando o têm), brincando no Orkut, ou o que é ainda pior envolvidos nas drogas. Sem disciplina seguem perdidos na vida. Realmente, nada está bom. Porque o que essas crianças e jovens procuram é amor, atenção, orientação e disciplina.
Rememorando, o que tínhamos nós, os mais velhos,  há uns anos atrás de estímulos? Simplesmente: responsabilidade, esperança, alegria. Esperança que se estudássemos teríamos uma profissão, seríamos realizados na vida. Hoje os jovens constatam que se venderem drogas vão ganhar mais. Para quê o estudo? Por que numa época com tantos estímulos não vemos olhos brilhantes nos jovens? Quem, dos mais velhos, não lembra a emoção de somente brincar com os amigos,  de ir aos piqueniques, subir em árvores? E, nas aulas, havia respeito, amor pela pátria.. Cantávamos o hino nacional diariamente, tínhamos aulas “chatas” só na lousa e sabíamos ler, escrever e fazer contas com fluência. Se não soubéssemos não iríamos para a 5ª. Série. Precisávamos passar pelo terrível, mas eficiente, exame de admissão. E tínhamos motivação para isso.
Hoje, professores “incapazes” dão aulas na lousa, levam filmes, trabalham com tecnologia, trazem livros de literatura juvenil para leitura em sala-de-aula (o que às vezes resulta em uma revolução),  levam alunos à biblioteca e a outros locais educativos (benza, Deus, só os mais corajosos!) e, algumas escolas públicas onde a renda dos pais comporta, até a passeios interessantes, planejados minuciosamente, como ir ao Beto Carrero. E, mesmo, assim, a indisciplina está presente, nada está bom. Além disso, esses mesmos professores “incapazes”,  elaboram atividades escolares como provas, planejamentos, correções nos fins-de-semana, tudo sem remuneração;
Todos os profissionais têm direito a um intervalo que não é cronometrado quando estão cansados. professores têm 10 minutos de intervalo, quando têm de escolher entre ir ao banheiro ou tomar às pressas o cafezinho. Todos os profissionais têm direito ao vale alimentação, professor tem que se sujeitar a um lanchinho, pago do próprio bolso, mesmo que trabalhe 40 h.semanais. E a saúde? É a única profissão que conheço que embora apresente atestado médico tem que repor as aulas. Plano de saúde? Muito precário.    Há de se pensar, então, que  são bem remunerados... Mera ilusão! Por isso, cada vez vemos menos profissionais nessa área, só permanecem os que realmente gostam de ensinar, os que estão aposentando-se e estão perplexos com as mudanças havidas no ensino nos últimos tempos e os que aguardam uma chance de “cair fora”.Todos devem ter vocação para Madre Teresa de Calcutá, porque por mais que  esforcem-se em ministrar boas aulas, ainda ouvem alunos chamá-los de “vaca”,”puta”, “gordos “, “velhos” entre outras coisas. Como isso é motivante e temos ainda que ter forças para motivar. Mas, ainda não é tão grave. Temos notícias, dia-a-dia,  até de agressões a professores por alunos. Futuramente, esses mesmos alunos, talvez agridam seus pais e familiares.
Lembro de um artigo lido, na revista Veja, de Cláudio de Moura Castro, que dizia que um país sucumbe quando o grau de incivilidade de seus cidadãos ultrapassa um certo limite. E acho que esse grau já ultrapassou. Chega de passar alunos que não merecem. Assim, nunca vão saber porque devem estudar e comportar-se na sala de aula; se passam sem estudar mesmo, diante de tantas chances, e com indisciplina... E isso é um crime! Vão passando série após série, e não sabem escrever nem fazer contas simples. Depois a sociedade os exclui, porque não passa a mão na cabeça. Ela é cruel e eles já são adultos.
Por que os alunos do Japão estudam? Por que há cronômetros? Os professores são mais capacitados? Talvez, mas o mais importante é  porque há disciplina. E é isso que precisamos e não de cronômetros.  Lembrando: o professor estadual só percorre sua íngreme carreira mediante cursos, capacitações que são realizadas, preferencialmente aos sábados. Portanto, a grande maioria dos professores está constantemente estudando e aprimorando-se.
Em vez de cronômetros, precisamos de carteiras escolares, livros, materiais, quadras-esportivas cobertas (um luxo para a grande maioria de nossas escolas), e de lousas, sim, em melhores condições e em maior quantidade. Existem muitos colégios nesse Brasil afora que nem cadeiras possuem para os alunos sentarem. E é essa a nossa realidade!  E, precisamos, também, urgentemente de educação para que tudo que for fornecido ao aluno não seja destruído por ele mesmo
Em plena era digital, os professores ainda são obrigados a preencher os tais livros de chamada, à mão: sem erros, nem borrões  (ô, coisa arcaica!), e ainda assim se ouve falar em cronômetros. Francamente!!!
Passou da hora de todos abrirem os olhos  e fazerem algo para evitar uma calamidade no país, futuramente. Os professores não são culpados de uma sociedade incivilizada e de banditismo, e finalmente, se os professores  até agora  não responderam a todas as acusações de serem despreparados e  “incapazes” de prender a atenção do aluno com aulas motivadoras é porque não tiveram TEMPO. Responder a essa reportagem custou-me metade do meu domingo, e duas turmas sem as provas corrigidas.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Duas Evas.

Antes de ler este texto, gostaria de informar que a função do filosofo e pensar e fazer que o outro pense, tenha pensamento critico, nada de formulas prontas ou receitas, como nos livros de auto-ajuda. Boa leitura.

por Luiz Felipe Pondé, para a Folha

Caro Leitor, quando você tem dúvidas de como fazer uma mulher feliz (desculpe-me a presunção de querer saber o que seja uma mulher feliz), como você faz?


Conversa com amigos? O irmão mais velho? Usa o velho método de tentativa e erro (claro, sempre errando ao final, porque afinal trata-se da mulher e seu desejo insaciável)? Sinto lhe dizer, essas soluções já eram. Existem métodos mais modernos. Um amigo me disse que hoje há uma tendência absolutamente inovadora no mercado dos afetos.

Qual é? Você não sabe? É duro ser ultrapassado, hein? Saiba que existem formas supermodernas para lidar com esta patologia (já descrita pela neurociência) como "lazy brain". Esta patologia consiste em cérebros que recusam novas sinapses e que se alojam em caixas cranianas (igualzinha à sua), que, por sua vez, são ligadas a ossinhos que, juntos, perfazem o que você singelamente chama de "meu pescoço".

O tratamento consiste basicamente em fazer primeiro uns 15 minutos de ioga, depois, mais 15 minutos de meditação transcendental e, por último, um curso de 15 minutos de clown mais todo tipo de inovação que a neurociência lançar naquele dia específico em que você se sentir ultrapassado.

E a nossa inovação de hoje? Quando você, leitor ultrapassado, tiver dúvidas de como lidar com uma mulher, contrate uma consultora lésbica. Esta consultoria deve ter sido inventada em um desses países superavançados onde todo mundo é livre, feliz, recicla lixo e anda de bike. Esses lugares onde existem milhares de pessoas com "consciência". Não confie seus segredos a pessoas com "consciência".

Segundo a nova tendência, a lésbica é, na realidade, quem melhor entende de mulher. Bem, ela é mulher. A lógica é bem lógica, afinal. Quem melhor sabe onde um corpo de mulher sente prazer do que alguém que tem um corpo de mulher? Quem melhor "sabe o que uma mulher quer na vida" (expressão tão metafísica quanto "salto quântico") do que alguém que "quer a mesma coisa na vida que a mulher, porque é mulher"? Será que a lésbica e a hétero querem a mesma coisa?

Calma. Beba um gole de água. Álcool não, porque ainda é cedo. Se não morrer de medo de câncer, fume um. Pense o seguinte. O mercado de "filme adulto" sempre colocou relações sexuais entre mulheres em filmes para heterossexuais, certo? E por quê? Porque o sonho de todo cara é sair com duas gatas e vê-las em ação. E qual a razão disso? Ninguém sabe.

Mistérios metafísicos... Deus existe? Minha mãe me ama? Serei feliz sendo honesto? Todo cara quer duas gatas... Who knows why? Deus está trabalhando neste exato momento, com sua equipe, tentando entender porque Adão exigiu duas Evas pra ele.

Sei que a esta altura a turma das chatas, que só gosta de eunucos, está gritando: "Isso é a prova de que o mundo é patriarcal e que o corpo da mulher é visto como objeto de consumo". Mas hoje estou sem saco de conversar com elas, que fiquem gritando. Hoje estou mais preocupado com as inovações no mercado dos afetos e com o que as lésbicas têm a nos ensinar.

Finalmente os héteros perceberam que os homos são o futuro? Os caras "entenderam" que lésbicas sabem dar mais prazer, carinho e compreensão às mulheres do que eles? Seria a vez das mulheres contratarem gays para explicar o que homens gostam na cama e na vida? No lo creo.

Ou isso tudo nada mais é do que o velho impulso cafajeste que existe em todo homem e que levou Woody Allen a colocar Scarlett Johansson beijando Penélope Cruz em "Vicky Cristina Barcelona"? Aliás, viu Deus? Aprenda com o ateu Woody Allen. Era isso que Adão tinha em mente, seu tolinho.

E você, cara Eva, você concorda que lésbicas "sabem melhor" o que você quer? Seu amigo gay lhe dá uma ideia melhor do que um homem de fato quer?

Ou será que, para além do sonho da Scarlett e da Penélope em ação, o homem está mesmo é perdido nessa era boring do "acesso" e da ciência na qual somos todos obrigados a "saber tudo" o tempo todo agora e "respeitarmos o espaço do outro"? E por isso, ele já não sabe o que fazer para saber o impossível: o que a mulher, afinal, quer? 

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Ancestralidade.

por Luiz Felipe Pondé para a Folha

Um homem deve reconhecer seus ancestrais. Existem várias formas de ancestralidade. Nossos autores prediletos são nossos patriarcas.

O primeiro texto que me marcou foi a Bíblia. Abraão e sua solidão diante de um Deus que armou sua tenda no deserto me deram um senso estético que nunca perdi. Seus profetas, num combate contínuo contra a estupidez do povo, fizeram de mim um cético com relação às virtudes populares.


Na medicina, Freud foi um encontro definitivo: o homem é um barco à deriva num mar de pulsões autodestrutivas. Vive como pode num mundo onde sua felicidade não parece fazer parte dos planos do Criador.

O Deus do ateu Freud é arrasador. Um judeu ateu é sempre um drama maior do que qualquer ateu, porque se assemelha à agonia de um vulcão.

Já na filosofia, o viés trágico se impôs com a descoberta de Nietzsche e sua filosofia do martelo, cujo desprezo mortal pela covardia e pelo ressentimento se tornou em mim uma segunda natureza. Sua política, uma espécie de anarquismo aristocrático, é sempre perigosa para os amantes dos rebanhos.

O ceticismo dos gregos, de Montaigne e de David Hume abalou para sempre minha capacidade de fé na razão, não em Deus, como pensa a vã filosofia.

Nunca acreditei muito no ser humano: considero o otimismo, principalmente hoje em dia, um desvio de caráter. Santo Agostinho e Pascal, cristãos pessimistas, me ensinaram que o cristianismo é uma história do homem combatendo ingloriamente (e cotidianamente) sua natureza afogada no mais sofisticado orgulho e na mais profunda inveja (de Deus). Quando me perguntam qualquer coisa sobre o ser humano, antes de tudo, penso como um medieval: os sete pecados capitais estão quase sempre certos. Somos pó que fecha os olhos diante do vento.

Dostoiévski é sempre essencial. Para mim, uma de suas descobertas capitais é que, ao contrário do que diz nossa miserável ciência da autoestima, apenas quando encaramos o mal (a "sombra" de uma espécie abandonada ao próprio azar) em nós é que recuperamos a vontade de viver. Só esmagando o orgulho com a humildade de quem se sabe insignificante é que vale a pena apostar no dia a dia.

Entre Nietzsche e Dostoiévski, aprendi que o niilismo, "esse incômodo convidado para o jantar", veio pra ficar e é apenas diante dele que vale a pena exercer a filosofia.

E o judeu Rosenzweig? Definitivo para quem pressente que a metafísica nada mais é do que pensamento mágico a serviço do medo da morte. E que não é a esperança mágica que deve nos guiar, mas a percepção de si mesmo como milagre em meio ao pó que em nós estremece. Rosenzweig pensa como o homem bíblico.

Quando "decidi" que a academia era pequena sem a mídia, os "jornalistas filósofos" passaram a marcar meu horizonte profissional. Otto Maria Carpeaux descreveu a imagem máxima da relação entre espírito e corpo: quando o primeiro se levanta, o segundo se põe de joelhos.

Nelson Rodrigues, que estava certo em tudo que falava, escrevendo uma obra entre Santo Agostinho, Dostoiévski e Freud, iluminou um fato consumado: se o mineiro for solidário apenas no câncer, então tudo é permitido.

Paulo Francis, uma eterna falta entre nós, percebeu que o medo e a mentira pautariam a vida intelectual futura e que o "bem político" seria a nova face da estupidez do pensamento público.

E finalmente a praga da "fé política". Contra essa, Edmund Burke e Tocqueville são bálsamos essenciais. 

Tocqueville, principal referência para entendermos a democracia, nos alertou para a natural vocação que esta tem para uma nova forma de tirania, a tirania da maioria. Antes de tudo, a democracia fez os "idiotas" (expressão rodriguiana) descobrirem que são maioria.

Burke nos lembrou, contra os que "amam a moda", que a sociedade é uma comunidade moral de almas, que reúne os mortos, os vivos e os que ainda não nasceram. Para Burke, é apenas neste arco de ancestralidade que o homem se faz homem, contra a banalidade do presente que nos assola.

Enfim, quem conhece sua ancestralidade, mesmo quando caminhando no vale das sombras, nunca está só. 

> As pessoas só valem pelo que servem para as outras.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

100%

LUIZ FELIPE PONDÉ
O clero fascista da saúde não para de botar para fora sua alma azeda; vida é desperdício, e ganancioso não gosta disso
Atenção, pecadores e viciados em sexo, comida, bebida, dinheiro e poder: vocês estão ultrapassados. Há uma nova ganância no ar: a mania de qualidade de vida e saúde total. Esta ganância é o que o jornal “Le Monde Diplomatique” já chamava de “la grande santé” (“a grande saúde”) nos anos 90. A mania de ter a saúde como fim último da vida.
Acho isso antes de tudo brega, mas há consequências mais sérias que um simples juízo estético para esta nova forma de ganância. Consequências morais, políticas e jurídicas: o controle científico da vida.
Agora esses fanáticos estão a ponto de demonizar o açúcar, a gordura e o sódio. Querem fotos de gente morrendo de diabetes no saco de açúcar ou de ataque cardíaco nas churrascarias. O clero fascista da saúde não para de botar para fora sua alma azeda.
Mas, como assim, ganância? Sim, esta ganância significa o seguinte: quero tirar do meu corpo o máximo que ele pode me dar. Inevitavelmente fico com cara de monstro narcisista quando dedico minha vida à saúde total. Sempre sinto um certo ar de ridículo nesses pais que obrigam seus filhos a comer apenas rúcula com pepinos e cenoura desde a infância.
Suspeito que os “purinhos”, no fundo, se deliciam quando veem fumantes morrerem de câncer ou carnívoros morrerem do coração. Sentem-se protegidos da morte porque vivem como “pombinhos da saúde”. São medrosos. A vida é desperdício, e ganancioso não gosta disso.
No caso da morte, probabilidade é como gravidade: 100% de certeza. Logo, a luta contra a morte é uma batalha perdida, nunca uma vitória definitiva.
Se você não morrer de acidentes (carro, avião, atropelamentos, assaltos, homicídios) ou de epidemias (tipo pestes) ou por endemias (tipo doença de chagas), ou de doença metabólica (tipo diabetes) ou de doenças cardiovasculares (tipo AVC ou acidente cardiovascular e ataque cardíaco), você sempre morrerá de câncer.
Claro, ainda temos contra (ou a favor) a tal herança genética. Você passa a vida comendo rúcula e morre de AVC porque suas “veias” não valem nada. Que pena, passou uma vida comendo comida sem graça e morreu na praia. E vai gastar dinheiro com hospital do mesmo jeito, ou, talvez, mais ainda. Sorry.
Logo, caro vegetariano, escapando de doenças cardiovasculares porque você evitou (religiosamente) gorduras supostamente desnecessárias, você pode simplesmente morrer de câncer porque deu azar com o pai que teve ou porque, no fim, tudo vira câncer, não sabia?
Um dia, esses maníacos da saúde total desejarão processar os pais por terem deixado que eles comessem coxinhas e brigadeiros quando eram crianças ou porque simplesmente tinham maus genes em seus gametas.
Sinceramente, não estou convencido de que viver anos demais seja muito vantajoso. Sem “abusar” da comida, da bebida, do tabaco, do sexo, das horas mal dormidas, não vale a pena viver muitos anos.
A menos que eu queira ser uma “freira feia sem Deus”, o que nada tem a ver com freiras de verdade, uso aqui apenas a imagem estereotipada que temos das freiras como seres chatos, opressores e feios , ou seja, uma pessoa limpinha, azeda e repressora.
Como diz meu filho médico de 27 anos, “nunca houve uma geração tão sem graça como esta, obcecada por viver muito”. Eu, pessoalmente, comparo esta geração de pessoas obcecadas pela saúde àqueles personagens de propaganda de pasta de dentes: com dentes branquinhos, cabelos bem penteados e com cara de bolha (ou “coxinha”, como se diz por aí).
Dei muita risada quando soube que alguns cientistas estavam relacionando câncer de boca à prática frequente de sexo oral. Será que sexo oral dá cárie também? Terá a vida sentido sem sexo oral? Fazer ou não fazer, eis a questão!
Essa ciência horrorosa da saúde total deverá logo descobrir que sexo oral faz mal, e aí, meu caro “pombinho da saúde”, como você vai fazer para viver sendo perseguido pela saúde pública? Talvez, ao final, não seja muito problema para você, porque quem é muito limpinho não deve gostar mesmo dessa sujeira que é trocar fluidos e gostos por aí.

ponde.folha@uol.com.br

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Patético

Desconfio de quem diz não dar valor ao dinheiro; normalmente se trata de uma falsa santidade
O QUE é mais importante na vida: ter ou ser? O que adianta ganhar o mundo e perder a alma? Para aqueles que não creem na alma, pode ser uma boa, não?
Se a vida não tiver sentido, quero passá-la num hotel cinco estrelas com uma mulher bonita do lado. E elas são caras. Amaldiçoados somos todos nós, mas é melhor ser infeliz com grana.
Sou do time de Nelson Rodrigues (em tudo): dinheiro só compra amor verdadeiro.
Uma forma fácil de você fingir que é legal é passar por alguém “superior” ao dinheiro. Eu, que sou um miserável mortal, confesso: adoro dinheiro. E confio mais em quem confessa que faria (quase tudo) por dinheiro. Desconfio de quem diz não dar valor ao dinheiro. Normalmente se trata de uma falsa santidade.
Os cínicos costumam dizer que perder a alma pode ser divertido se você tiver bastante grana.
Outros afirmam que só quem pode comprar tudo o que o dinheiro pode comprar sabe o que o dinheiro não pode comprar. Lembremos a excelente campanha publicitária do Mastercard “priceless”: só quem tem Mastercard sabe o que não tem preço. Promessas de pobres sobre a própria integridade são bravatas. Quando você não tem nada, é fácil dizer que não dá valor a nada.
Diante de questões como essas, gosto de citar uma passagem (supostamente verdadeira) da vida de Napoleão Bonaparte, o cavaleiro da modernidade.
Napoleão estaria conversando com o czar da Rússia sobre o futuro das relações entre a França revolucionária e a Rússia quando o czar disse (um tanto horrorizado com a “gula pelo poder” daquele falso imperador Napoleão, um reles novo rico): “Eu luto pela honra, o senhor luta por dinheiro”. Ao que Napoleão teria respondido: “Cada um luta pelo que não tem”.
Suspeito que muito do desprezo por dinheiro é na realidade falsa virtude. E falsa virtude é uma das qualidades humanas mais democráticas: todo mundo tem. É sempre chique você desprezar dinheiro e acusar de ganancioso quem não o faz. Mas a verdade é que dinheiro nunca é apenas dinheiro. Faz parte da estratégia da falsa virtude dizer que é.
Dinheiro traz consigo amigos, mulheres, poder, satisfação, emoções, restaurantes bons, reconhecimento, segurança, remédios, psicoterapia, tempo livre, cultura, arte, vida familiar estável, boas casas, lareiras, vinho francês, férias, bons hotéis, filhos felizes, mulheres generosas na cama, sorrisos largos, poesia, romances avassaladores em cenários paradisíacos, uma maior expectativa de vida.
Fala-se muito dos ganhos da ciência, mas estes só foram possíveis porque a indústria farmacêutica existe e ganha dinheiro “vendendo” mais expectativa de vida e daí reinveste na pesquisa.
Adultos infantis dizem: “Maldita seja a indústria farmacêutica!”. Quero ver quando eles precisarem de remédios. Claro que grana não impede você de ter um câncer, mas pode garantir mais acesso à quimioterapia, a melhores hospitais e a médicos mais atenciosos. Claro que você pode deprimir numa BMW, mas ainda assim você estará numa BMW, não? Coitado de você, tão triste numa BMW…
Sou do time de Nelson Rodrigues (em tudo): dinheiro só compra amor verdadeiro. Só almas superficiais não têm um preço. Só elas não sabem de nossa tragédia: sempre estivemos à venda.
Haveria algo que dinheiro não compra? Amizade sincera, fidelidade, felicidade? Uma grande desgraça na vida é que, sim, você pode ter muita grana, mas não ter nada disso. Mas dificilmente a culpa será do dinheiro. Este sempre facilita as coisas e não o contrário.
A maior parte daqueles que falam mal do dinheiro é porque simplesmente não o tem. E aí está a falsa virtude, aquela mesma que atrapalha qualquer “crítica” verdadeira a um mundo miseravelmente submetido ao dinheiro. Os que se afirmam livres do desejo pelo vil metal são os piores quando têm a chance de tê-lo. Só quem abre mão da própria vida está acima do dinheiro, o resto é conversa mole.
Dinheiro reúne em si todas as qualidades humanas. Brilha, emociona, trai, acumula, se vinga, projeta, constrói, destrói, oprime, esmaga, ergue, resolve e cria problemas, sufoca, faz respirar, faz chorar, faz promessas, mente.
Cheio de paixões, patético, como você e eu.

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Luiz Felipe Pondé